quinta-feira, 25 de novembro de 2010

24 de novembro. greve geral. porto.

estava pouca gente no centro da cidade. estava frio. era uma espécie de domingo e ao domingo quando está frio as pessoas gostam de casa. muitas coisas abriram as portas para manter a economia viva e a conta sobrevivente. era provavelmente um dia que poderia ficar para a história... mas o problema do frio. não é por acaso que as revoluções são filhas do bom tempo. deu vontade de participar na ruptura e fui para o centro. com a ilusão da mudança. mesmo com umas imagens de poesia a circular-me na cabeça enquanto me dirigia para o centro. maldito frio. o centro estava inanimado. umas pessoas com uma revolta irónica e completamente inofensiva desfilavam tantans de outros tempos. era uma espécie de desfile teatral foleiro e surrealista. com uma política de pacotilha a armar ao cagalhão intelectual e maldito de um certo estilo de literatura. ficou-se ali numa clareira no meio da meia dúzia. estava mesmo frio. estava frio e a massa humana não aquecia. pior. também não arrefecia. nada a acrescentar. como há quem saiba que o povo tem certas tendências carneirísticas e primeiro matar a fome e só depois fazer a revolução... nem a massa humana que estava contra o sistema aquecia a alma e nem a massa humana que defende o sistema compareceu. um mísero carro de segurança escolar com dois agentes fardados. um carro parado ao pé de um banco com três agentes fardados. nada mais. nem uma caganita de crédito o sistema dá a estas manifestações de quase afecto rancoroso. com uns tantans de fundo e uns slogans esbatidos e envergonhados com umas siglas irónicas e outras palermices que tais. impossível para mim perceber uma coisa. como é que não há jovens a fazer revoluções? a classe estudantil não compareceu. o tal famoso operário também não. esta espécie de domingo de inverno que se vivia não me conseguia alegrar minimamente. na noite anterior tinha sonhado grandes frases. ali apresentava-se-me o fantasma cadavérico do imutável. a decomposição vivida em tempo real desta forma de luta. para defender o meu pensamento disse-me a mim mesmo: espero que em lisboa tenha sido diferente. nada de extraordinário ouvi nas notícias. como se uma paragem fosse extraordinária. como se a solução fosse económica. como se a solução não passasse por uma mudança radical no conceito de ser humano. porque se vive no país que defende que a desunião faz a força. porque o país sou eu. e tu. e todos. que país? o que é um país senão a sua riqueza humana? sei lá eu de sistemas económicos... não há nenhum que funcione. só a abolição é contrária ao suicídio. e talvez a guerra seja melhor do que esta paz armada. esta paz conformista que permite que nos cansem a cabeça e nos matem o corpo com as suas ninharias de fato e gravata. com as suas fotografias. com os seus títulos de jornais. como se o universo imenso parasse por uma senhora alemã carregar no botão. ou um senhor francês. ou um senhor inglês. ou um senhor norte-americano. porque nós somos escravos silenciosos de uma ilusão da necessidade. não é o capitalismo sobrevivente que faz movimentar o universo. os domingos de frio e o resto dos dias da semana já me dão asco. as imagens da farda dos fatosgravatas já me dão asco. as frases que o mundo gasta com os discursos dessa gente já me dão asco. este sistema dá-me asco. a máquina exterior do mundo dá-me asco. os tantans do sobrevivente que manifesta o seu afecto rancoroso dão-me asco. os senhores que sabem que a malta é serena dão-me asco. abominei completamente este dia. que raio de tempo inútil que gastei no centro da cidade. que raio de frio. a conclusão: este país tem o que faz por ter. e isso dá-me um tremendo e insuportável asco.

1 comentário:

  1. A mim dá-me asco ver na tv a fronha diabólica daquela Ministra Helena André do Trabalho (qual trabalho?) e da Solidariedade (da o quê???), fez 50 anos no mês passado, dava-lhe o equivalente físico daquela bebida que se serve no bar Arroz Doce, Rua da Atalaia, Bairro Alto e dava-lhe com força!

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