quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

a menina grita, tem os tentáculos do poder demasiado afiados para fazer carícias e assusta-se. a menina grita. deitada na relva. na sombra precoce da ilusão. a menina grita. mas quem é a menina? desde quando é menina a menina? a menina que usou bigodes postiços, bigodes de algas, bigodes de merda. bigodes de saliva que lhe conspurcavam a boca como um vómito. barbas. a menina grita. a menina dança. a menina não é menina nenhuma. escorre pelas ruas fora. debaixo de ilusões. debaixo do seu futuro radioso de menina. no seu futuro radioso de menina. no seu mundo de ilusão. crime. crime. música ou dança. menina deitada. sentada. saltitante. os olhos que se atiram para fora da caixa craniana e que esperam que as suas mãos estejam em baixo. mãos de sono. sonho. tantas vezes o sonho se confunde com um cheiro de latrina que chega a provocar vómitos. mas a menina grita. o que conta é que a menina grite. que a menina dance. que a menina dance no meio do ruído telescópico. que a menina se atire da sua mesa para as mãos dos fiéis. que caia. que ande sobre a água como um messias distante. a ferrugem dos dias ocupa o solo. anda-se nele. come-se nele. mas a menina respira um estranho ar superior. o maldito ar da sobrevivência. o maldito ar corrupto da sobrevivência. e a menina espalha terror à sua volta. tudo morre no seu horizonte de contemplação. tudo se torna turvo. os seres de ouro das ruas da cidade zero vomitam com o passar da menina. ganham uma doença incurável. uma doença nova. uma doença de tempo. começa a cair cinza. chove cinza. cai uma coloração aérea sobre as cabeças. ninguém respira. mas a menina lá insiste nos seus gritos. no seu solilóquio carnalmente artificial. e depois o homem está no centro da pista e ela beija-o com um vómito vulcânico. ele não respira. a menina beija-o com o seu vómito e fura os olhos do homem com os seus tentáculos afiados de poder. e o homem cai como os seres da rua da cidade zero. e a menina voa sobre ele e executa danças alucinantes. o homem afunda-se na terra. a menina voa. voa. voa. voa.

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