sexta-feira, 24 de setembro de 2010

o rosto continuava prisioneiro da sua ilusão. nada havia a fazer. o corpo tinha acabado de sair da sombra volátil da idade. tudo se tinha resolvido. mas nestas coisas de bem e de mal nunca há absolutos. nas noites de fogo o carácter larvar da carne sobrepunha-se ao pensamento. eram noites de podridão saturada. o rosto consumia-se desalmadamente para conseguir respirar, para se conseguir soltar de armaduras mentais. fogos no interior líquido do cérebro. e se de repente o mundo se abrisse para que as crianças descobrissem o núcleo vermelho da vida... quando se caminha pelas ruas e há quem se torne num bicho de labaredas de sangue, contra os carros, contra as paredes, no chão imundo das cidades. quando se solta o grito pornográfico do outro que nada vazio no seu leito da vida. os animais respiram a tranquilidade saloia dos salões de baile. mulheres e homens com cabeças de cão trazem bandejas com as mais finas iguarias. espalham a comida sobre as tetas e sobre os pénis. começam com rituais frenéticos e obscuros até que a espuma chegue à boca. espuma que deixa o chão peganhento. o rosto apropria-se da sua prisão. alucina festins em tons de ouro e de sangue. uma ou outra lágrima furtiva se dirige para a terra. nada de música nesta imagem de miséria.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

depois vinham com mãos leves e sujas de cinza. queriam voltar a tocar-te. o vento empurrava esse pó descolorado para longe dos teus olhos. havia ainda algo que ardia mas que rapidamente era esquecido. ou escondido. ou que funcionava como um eclipse. a fugacidade do futuro era tão habitada pela instabilidade que não se sabia nem se dizia nada. uns rastejavam como seres de estranha superioridade diante do teu corpo. diziam eu eu eu eu eu eu eu eu. os olhos e os ouvidos já se desligavam desse lado absurdo. vinha o fumo e a bebida. o amor chamava-te na distância miserável dos dias. por vezes uma voz escutava-se como se fosse uma linha de uma rua. andava-se nela. viajava-se numa esperança sonora dominada por um secretismo de atrocidade. tinha ódio a palavras. as mãos tremiam nas noites e vinham acompanhadas de uma transpiração fria. filmes para conseguir dormir. correr na rua. roubar conversas a alguém como se isso fosse uma condição final de sobrevivência. quem estaria escondido do outro lado do espelho? alguém te olhava com a mesma realidade essencial e defendida a todas as horas? quem és? a pergunta tornava-se num ruído de água e de saliva que divagava no espaço por cima da cabeça. o nada mental. talvez menos. uma corrente silenciosa que tinha roubado a forma do corpo diante dos seus olhos carnívoros. algo se passava de estranho e milagrosamente inconsequente. algo se passava. a luz deslizava suave mas com as mãos e a boca num outro sexo musical e nada fazia nada. ninguém impedia a guerra. ninguém se revoltava contra tamanho crime. normal. os ecrãs tornaram as pessoas objectos da vontade. o mundo remeteu-se ao carácter silencioso do crime perfeito. um pai disse isto é o meu sangue. os filhos defenderam o mesmo rumo feito de merda e líquidos belicosos. a mãe era tão desnecessária que nem é para aqui chamada. mãe de cinza. consumidora de páginas de respirações vazias. carburadora subtil de mentiras e abstracções. ele lá se ia desenrolando como a carne nos mercados urbanos. carne ignorante e saturada dos sonhos e congelada como a melancolia da idade passada. alguém trouxe uma carta a dizer que o crime era uma opção coerente da vida. as trombetas e os tambores tocaram marchas. os olhos puseram-se no terreno do combate. o horror era apenas uma passagem para um lugar de dentro.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

escrever é solitário. viajar é solitário. dormir é solitário. ficar em sofás é solitário.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

e pronto... espero que se acabe de uma vez por todas com este verão que já está a assumir contornos absolutamente malignos para a minha cabeça e para a minha carteira!!! as coisas lá foram correndo com normalidade nestes meses de ausência blogueira. fiz o meu espectáculo em alpedrinha e correu mais ou menos bem. não há coisas perfeitas mas o trabalho é mesmo esse, lutar pelo absoluto. diz-se que vamos apresentar o espectáculo na moagem!!! aguardam-se direcções. será a minha estreia na moagem... afinal devo ter sido o único construtor de espectáculos fundanense que ainda não meteu lá os pés!!! isto promete meus caros. a experiência em alpedrinha foi altamente. fomos muito bem tratados, como convém onde quer que se vá!!! mais 74 pessoas que assistiram ao espectáculo... não foi nada mau. agora é porto outra vez, mais um espectáculo com o carretas, que é sempre altamente espectacular, nos entretantos ainda fui a barcelona trabalhar nas festas de grácia na casa portuguesa... é dia e noite... é dia e noite... as costas lá se vão queixando mas pronto, descanso quando morrer. não ando com internet e não tenho escrito nada que valha a pena. só umas ideias atiradas para um caderno ou outro ou para dentro do super portátil que me acompanha como se fosse um braço!!! hehehe quando houver uma novidade ou outra... cá virão parar.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

regresso.

entrar numa sala de miséria e de fome
o desespero do tempo esconde rupturas
são máscaras, amor, são vozes estrangeiras
os monstros amargos que se alojam no olhar

depois do caos a calmaria abundante do vazio
alguém sorri no absurdo violento da distância
dizem-se coisas pensamentos sentidos
mostra-se todo o nada ardente nos dedos

edifícios prisões mentais linguagens de sangue
beijos ácidos roubados em escadarias na noite
palavras cuspidas demasiadas abstracções trementes

fugir de poemas socorrer pássaros brancos
vomitar incestos escavar sepulturas cerebrais
nadar numa espécie de inverno rigoroso da vida